A imagem de um trevo está no centro de uma disputa entre a Capodarte, da fabricante Paquetá Calçados, hoje em recuperação judicial, e a Madig Comércio e Importação, que é licenciada da Carolina Herrera no Brasil. Após pedidos de liminar negados, em fevereiro, uma sentença passou a impedir a empresa estrangeira de usar o desenho, também conhecido como “rosetta”, em seus produtos. Cabe recurso.
A representante da Carolina Herrera no Brasil também deverá pagar indenização por danos materiais e morais à Paquetá Calçados. O caso que gerou o processo ocorreu em 2022, em uma loja Carolina Herrera do Shopping Cidade Jardim, em São Paulo.
Lá foi constatado que havia produtos à venda com os símbolos nos formatos trevo/”rosetta” da Capodarte. Depois, de acordo com a Paquetá Calçados, o mesmo foi verificado em lojas no shopping Iguatemi, na capital paulista, e no Catarina Fashion Outlet, em São Roque, no interior de São Paulo. No processo, a empresa brasileira alega que detém direitos autorais sobre a marca figurativa de um logotipo semelhante a um trevo ou “rosetta” e também da marca mista, que além do símbolo tem o nome “Capodarte”. Apesar disso, alegou, tomou conhecimento da Madig/Carolina Herrera, usando o símbolo do trevo e, segundo alega, causando confusão da clientela, além de concorrência desleal.
A Madig diz que não é titular da marca “CH Carolina Herrera”, mas uma sublicenciada autorizada a usar a marca no Brasil, nos termos do contrato de franquia. Alegou ainda que o uso do símbolo em questão nos produtos não se presta ao papel de identificador de marca, “pois são vulgares e possuem baixa distintividade”. A empresa defende ainda a nulidade do registro das marcas, que teriam sido depositadas de má-fé, pois seriam usadas pela estrangeira antes do pedido de registro. Ainda segundo as alegações da Madig, não há confusão de clientela.
Em 29 de fevereiro, a juíza Marina Dubois Fava, da 1ª Vara Empresarial de Conflitos de Arbitragem do Estado de São Paulo, aceitou o pedido da Paquetá Calçados. A juíza destaca que a Capodarte realmente é titular dos registros no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e que foram apresentadas provas, no processo, de utilização indevida da marca pela Madig. “Observo que o produto comercializado seria abarcado pela especificação da marca de titularidade da autora, tratando-se em ambos os casos de calçados, bolsas e acessórios de vestimenta, de forma que pode haver desvio de clientela ou confusão do consumidor pelo uso do elemento figurativo da ‘rosetta’, registrado como marca pela autora”, afirma, na decisão.
A juíza considerou que a violação às marcas pode causar confusão no consumidor e desvio de clientela, quando se trata da reprodução idêntica ou muito semelhante do elemento figurativo. Na decisão, também ponderou que, apesar do uso difundido do sinal da “rosetta”, a Capodarte efetivamente conseguiu o registro da marca, enquanto a Carolina Herrera não possui direito de uso sobre o signo. “O que diferencia a concorrência leal da desleal é exatamente o meio empregado pelo empresário para conquistar a clientela do outro”, afirma a magistrada.
A decisão determina que a Madig se abstenha de comercializar itens que ostentem a marca figurativada e de reproduzir em seus produtos os desenhos industriais devidamente registrados e que são característica dos produtos da Capodarte. O valor de lucros cessantes (quanto a Capodarte deixou de ganhar com a prática) devido deverá ser apurado em liquidação de sentença. Foi imposto dano moral de R$ 30 mil, acrescido de correção monetária desde a data da decisão e de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data do evento danoso, que se considera em 13 de outubro de 2022. Também foi imposta pena de multa diária pelo descumprimento de R$ 1 mil, até o limite de R$ 20 mil, podendo ser majorada em caso de descumprimento reiterado.
A advogada da Paquetá Calçados, Luciana Manica, head de propriedade intelectual no escritório Carpena Advogados, afirmou que, antes do processo, a multinacional foi notificada e foram realizadas reuniões. “A produção da Carolina Herrera é feita no exterior e os produtos são remetidos ao Brasil e demais países. Foi feito contato direto, mas eles interpretaram que não houve violação”, afirmou. A advogada lamenta não ter conseguido a decisão já via pedido liminar. “Mesmo comprovando todos os títulos perante o INPI não conseguimos a liminar. É o desprestígio que, por vezes, nosso Judiciário dá para a propriedade de uma empresa brasileira”, disse ela. Procurado, o advogado da Madig, Hiago de Borba Busch, sócio do Vilela Advogados, informou que discorda da sentença e prepara recurso (processo nº 1105812-39.2022.8.26.0100).